quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Verdades de outrora...mentiras de agora...


A idéia de que existe alguma coisa além deste simples mundo, desta vida terrena, é algo que permeia o imaginário humano há muito tempo. Não é com os textos bíblicos que estas ideias surgem. Egípcios, Sumérios, povos africanos e asiáticos tem este mito impregnado em suas crenças há milênios.
Estes “fatos” permaneceram em nosso imaginário até os dias atuais, mas até que de uma forma mais amena do que há alguns séculos atrás. No período dos viajantes, das grandes navegações do século XVI, que afirmavam terem encontrado o paraíso terrestre, ou alguma coisa bizarra parecida com isto, havia mapas relatando lugares recém descobertos, como por exemplo, Cuba ou a Martinica próxima ao paraíso, ao jardim do éden.  A Martinica seria descrita por muitos navegadores, religiosos e homens de grande “confiança”, como uma terra habitada somente por mulheres guerreiras, possivelmente as famosas amazonas. Diziam-se desta ilha que em determinadas épocas do ano lá desembarcavam homens para procriar. Quando nasciam meninos, estes eram enviados para a ilha de onde haviam vindo os homens (Porto Rico) e as meninas permaneciam na Martinica com suas mães guerreiras. Textos descrevendo encontros com estas mulheres guerreiras existiram aos montes, em variados lugares, desde descrições dizendo terem sido “avistadas algumas delas em uma praia, a pouca distância, por sinal, da paragem onde Colombo tentara situar o paraíso terrestre.” Pode-se dizer que “de semelhante espetáculo, porém, onde o real e o imaginário parecem fundir-se, deveria nascer o ambiente mais propício ao mito” (HOLANDA, 1994.p.25).
Uma fonte “confiável” a respeito de tais mulheres foi o padre Cristoval de Acunã que disse: ”El tiempo descubrirá La verdad, y si estas son las amazonas afamadas de los historiadores, tesoros encierra em su comarca para enriquecer a todo El mundo! (op.cit.p, 26). Outro religioso, Frei Gaspar de Orellana relatou o “encontro” que teve com tais mulheres. Dizia o frade que as mesmas eram muito ferozes, e que exerciam muito poder diante dos índios, e que estes não tinham coragem de fugir, pois sabiam que se tentassem fazê-lo, seriam mortos a pauladas. As amazonas guerreiras foram descritas pelo frei como “membrudas, de grande estatura e brancas! Tinham cabeleira muito longa, trançada e revolta no alto da cabeça, andavam nuas, e que cada uma delas valia por dez homens em um combate”.
Sérgio Buarque de Holanda nos relata em seu livro “Visão do Paraíso” que estes relatos e estas crenças eram muito difundidas entre vários povos. Religiosos munidos do conhecimento escolástico e filosófico como os já citados, ajudaram a difundir tais “verdades”.  “Santo Isidoro, “acreditava piamente na existência de seres estranhos e chegou a dividi-los em quatro ramos distintos; os portentos, os ostentos, os monstros e os prodígios,” e afirmou:” foram feitos pela vontade divina e a natureza de toda coisa criada é a vontade de todo criador”. (op.cit, p17, 1994).
Esses seres estranhos a que se referia o religioso santificado, se tratavam de mulheres que concebem aos cinco anos para morrerem aos oito, homens sem cabeça e com os olhos e a boca no peito, hermafroditas com um peito feminino e o outro masculino, outros homens com cabeça de cão, com rabos com mais de um palmo de comprimento. Seres humanos que se alimentavam apenas do perfume de flores, ciclopes ( apenas um olho no meio da testa), outros com os pés apontados para trás e com oito dedos (lembra-nos o Curupira?) ou outros com uma só perna (seria o saci?) (op.cit, p18).
Há ainda relatos de homens que nascem velhos e vão se tornando jovens, e da famosa fonte da juventude. Outros relatos que descrevem como “chegar” a locais sagrados como a ilha dos santos. “Na história, por exemplo, das peregrinações de São Brandão, originárias das antigas lendas Celtas, a ilha dos santos, meta dos navegadores irlandeses, só é atingida após dilatada viagem sobre um mar infestado de dragões e gigantes”( isto não se parece a Ilíada de Homero?) ”(op.cit, p.20).
Os relatos a respeito da fonte da juventude são diversos. Na América recém descoberta, tal fonte “ficava” situada no atual estado da Flórida no EUA. Pedro Mártir de Anghiera descreveu a fonte, seus benefícios e entregou este relato ao Papa leão X como um documento portando relatos de experiências verídicas. A crença na existência destas águas milagrosas fez com que muitos aventureiros, nobres e religiosos se embrenhassem no novo mundo em busca de seus efeitos.
Os que se aventuraram nas terras do novo mundo tinham além dos interesses materiais de se conseguir aqui prestígio e riqueza, que para a maioria seria impossível de se conseguir na Europa, traziam em seu imaginário uma série de crenças, de mitologias, que iam muito além das crenças judaico-cristãs. Estes outros mitos ajudaram a moldar e a recriar muitas outras lendas que até hoje sobrevivem. Como já visto, é possível encontrar similaridades entre estas crenças mais antigas e algumas outras lendas que permeiam culturas mais antigas na Europa, e em nossa própria cultura, principalmente nas indígenas.
Podemos nos perguntar sobre quais destas lendas ainda permanecem? Onde é possível encontrar continuidades com estas crenças absurdas? Por que será que tantas pessoas acreditavam em coisas tão inverossímeis aos nossos olhos contemporâneos? Não serão nossas crenças atuais algum dia motivo de textos como esse que escrevo? Até quando durarão nossas verdades?
Todas estas perguntas permeiam minha cabeça. Sabemos de fato que todas estas coisas não se passavam de puro excesso de imaginação, ou quem sabe uma forma de ganhar prestígio como grande aventureiro. Um estudo mais aprofundado nos responderá isso. Por enquanto acho que vale a indagação a respeito de como podemos ser iludidos com falsas verdades, e como estas podem perdurar em nosso imaginário. Cabe a nós nos perguntarmos a respeito de nossas verdades, se são consistentes ou apenas verídicas como nosso papai Noel de nossos primeiros passos nesta vida terrena.
                                                                                           Alex Grijó

quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

Por que gostamos de ser enganados?


Está chegando o dia 25 de dezembro e com ele praticamente a obrigação de consumir desesperadamente, somos bombardeados o tempo todo pela mídia nos incentivando ao consumo desenfreado, uma coisa quase que desumana e irracional. Em nome do papai natal, pois este é o nome do bom velhinho em português, aliás, nome bem sugestivo ligando ele as comemorações natalinas e nos fazendo sentir através de suas musiquinhas a vontade de dar presentes e mesmo sabendo que tudo não passa de pura ilusão, puro marketing para fazermos gastar nosso suado dinheiro. Mesmo assim nos sentimos atraídos por essa data e acabamos fazendo o que a maioria faz, ou seja, somos manipulados pelo espírito natalino e quando caímos na real já nos endividamos em boa parte do próximo ano. Aliás o papai Noel que conhecemos hoje não tem nada do original. No inicio desta tradição quem distribuía os presentes era uma pessoa real sem carruagem fantasiosa e nem renas voadoras. Seu nome era Nicolas ou São Nicolas depois de transformado em santo pela igreja católica.
Nicolas vivia em um lugar chamado myra, hoje Turquia, por volta de 300 dC. A data do natal não tem nada haver com Nicolas, esta tem relação com festividades pagãs em celebração ao retorno da chegada da luz solar por dias mais longos e o fim do inverno. Na verdade eram varias comemorações sem data fixa celebradas em dias diversos em varias partes do mundo. Essa estória de natal, Jesus nascer neste dia, começa  no século 4 DC com o então papa Julius I, que muda para sempre a história do natal escolhendo o dia 25 de dezembro como data fixa para celebração das festividades. A idéia era substituir os rituais pagãos por uma festa cristã, com isso a adoração a Mitra (um outro deus pagão) que tem uma trajetória bem parecida com a de Jesus Cristo, ou melhor, cristo que tem a trajetória parecida com a dele, já que a história de Mitra é bem mais antiga, será esquecida. Com o passar dos anos o mitraismo seria deixado de lado e todos passariam a ser cristãos. É com o imperador Constantino a partir de 312 dc que o cristianismo passará a ser a religião oficial do império romano. A partir daí, várias práticas pagãs serão mescladas ao culto cristão, como por exemplo, a cerimônia em devoção a deusa Isis, que será praticada da mesma forma, só que agora em devoção a Maria.
Mitra que seria uma divindade nascida muito antes do Cristo e que terá a data de 25 de dezembro como dia de seu nascimento, também teria nascido de uma virgem e ressuscitado ao terceiro dia.
Será no ano de 350 d.C. que o natal passará a ser comemorado em 25 de dezembro pelos cristãos. Inicialmente esta data também era utilizada para adorar a Saturno, o deus da agricultura. Será a partir de um decreto do Papa Júlio I em 350, que a veneração a Saturno ou a mitra, dará lugar ao nascimento do menino Jesus.
O papa Júlio por sua conta própria nada mais fez do que inventar uma data para o nascimento de Jesus, escolhendo uma data muito significativa para muitas pessoas, que já tinham o costume de praticar rituais religiosos nesta data. Com certeza ao passar de algumas gerações, estes outros deuses que cederam lugar para o deus cristão como deus oficial de Roma, iriam ser esquecidos. Era como se Júlio tivesse pensado: ”preciso apenas trocar o nome do deus, manter as tradições intocadas e o tempo e as pregações constantes farão o resto.”
A partir daí foram inventadas inúmeras tradições cristãs, e os burgueses do século XIX e sua desenfreada busca pelo lucro souberam aperfeiçoar, fazendo com que você acredite que realmente precisa gastar todo seu décimo terceiro em presentes, que nesta noite nasceu o menino Jesus (que ninguém sabe se de fato nasceu, e que também não nasceu há dois mil e dez anos atrás) e que Jesus é de fato o senhor e salvador e Midas do comércio de fim de ano. E viva o natal, o papai Noel, a mula sem cabeça, o curupira, o saci pererê e tudo aquilo que você acredita que existe, mesmo sabendo que não existe.


                                                                     Lairte Almeida / Alex Grijó

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Obcecados pelo melhor.

Estamos obcecados com "o melhor".
Não sei quando foi que começou essa mania, mas
hoje só queremos saber do "melhor".


Tem que ser o melhor computador, o melhor carro,
o melhor emprego, a melhor dieta, a melhor
operadora de celular, o melhor tênis, o melhor vinho.


Bom não basta. 


O ideal é ter o top de linha, aquele que deixa os
outros pra trás e que nos distingue, nos faz sentir importantes,
porque, afinal, estamos com "o melhor".

Isso até que outro "melhor" apareça -
e é uma questão de dias ou de horas até isso acontecer. 


Novas marcas surgem a todo instante.
Novas possibilidades também. E o que era melhor,
de repente, nos parece superado, modesto, aquém
do que podemos ter.

O que acontece, quando só queremos o melhor,
é que passamos a viver inquietos, numa espécie
de insatisfação permanente, num eterno desassossego.

Não desfrutamos do que temos ou conquistamos,
porque estamos de olho no que falta conquistar ou ter. 


Cada comercial na TV nos convence de que merecemos
ter mais do que temos.
Cada artigo que lemos nos faz imaginar que os
outros (ah, os outros...) estão vivendo melhor,
comprando melhor, amando melhor, ganhando
melhores salários.

Aí a gente não relaxa, porque tem que correr atrás,
de preferência com o melhor tênis.

Não que a gente deva se acomodar ou se contentar sempre com menos.
Mas o menos, às vezes, é mais do que suficiente.

Se não dirijo a 140, preciso
realmente de um carro com tanta potência?

Se gosto do que faço no meu trabalho, tenho que
subir na empresa e assumir o cargo de chefia que
vai me matar de estresse porque é o melhor cargo
da empresa?

E aquela TV de não sei quantas
polegadas que acabou com o espaço do meu quarto?

O restaurante onde sinto saudades da comida de
casa e vou porque tem o "melhor chef"?

Aquele xampu que usei durante anos tem que ser aposentado
porque agora existe um melhor e dez vezes mais caro?

O cabeleireiro do meu bairro tem
mesmo que ser trocado pelo "melhor cabeleireiro"?


Tenho pensado no quanto essa busca
permanente do melhor tem nos deixado
ansiosos e nos impedido de desfrutar o
"bom" que já temos


A casa que é pequena, mas nos acolhe.

O emprego que não paga tão bem, mas nos enche de alegria.

A TV que está velha, mas nunca deu defeito.

O homem que tem defeitos (como nós), mas nos
faz mais felizes do que os homens "perfeitos".

As férias que não vão ser na Europa, porque o dinheiro não deu,
mas vai me dar a chance de estar perto de quem amo... 


O rosto que já não é jovem, mas carrega as marcas
das histórias que me constituem.


O corpo que já não é mais jovem, mas está vivo e
sente prazer.


Será que a gente precisa mesmo de mais do que isso? 


Ou será que isso já é o melhor e na
busca do "melhor" a gente nem percebeu?
 


                                                                                                             Leila Ferreira

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Políticos, Violência, atentados, e mentiras...

Políticos, violência, atentados, mentiras e aspirinas...
            A cidade do Rio de Janeiro vive uma onda de ataques violentos, que alguns chamam de terroristas, e que o estado diz ser uma reação a instalação das Upps em favelas do estado. Estes ataques não são os primeiros a ocorrer na cidade. No ano de 2007, quando não havia Upps, vários ônibus foram incendiados, vários ataques violentos foram cometidos. Acho que o que faltou para o estado daquela vez foi uma boa desculpa, que, com a criação das Upps ficou tudo resolvido! Agora temos uma grande desculpa! Toda a violência é uma resposta ao nosso trabalho! É por causa das Upps nas favelas! Se todos fôssemos idiotas talvez, talvez, acreditássemos nestas mentiras.
Existem em torno de 500 favelas na cidade do Rio de Janeiro, e algo em torno de apenas 15 Upps. O efetivo da PM nestas favelas fica em torno de 2%. Acho que isto não é uma boa desculpa para tanta violência.
 A violência na cidade do Rio não é de hoje. Quantos turistas vêm à cidade e retornam a seus países dentro de caixas de madeira? Quantas crianças são assassinadas todos os dias por sabe-se lá quem? Quantas pessoas morrem nas filas dos hospitais vítimas dos bandidos que roubam verba pública? São estes melhores que os traficantes das favelas?
Fico a me perguntar como estas coisas funcionam? Por que ocorrem?(apesar da declaração do secretário José Mariano Beltrame de que os motivos não importam). Vemos todos os dias na TV jornalistas declarando os números que circulam no meio do tráfico. São sempre milhões e milhões de reais e de dólares por conta da venda de drogas. Me pergunto se esse dinheiro fica lá, guardado nos barracos? Ou se não estaria em algum banco legal, que certamente é fiscalizado pelo banco Central. Onde fica esse dinheiro?
E as armas que chegam as favelas? De onde vêem? De outros países? De acordo com o ex-capitão do Bope, Rodrigo Pimentel não. Segundo ele, 80% das armas que chegam as favelas são provenientes do estado de São Paulo, de uma fábrica que lá existe. Por que não é feito nada?
 Para responder a esta pergunta recomendo um filme chamado Canadian Bacon, ou toicinho canadense do polêmico Michael Moore. No filme, os americanos se encontram em paz, sem nenhuma guerra ocorrendo em nenhuma parte do mundo. Isto traz conseqüências gravíssimas para sua economia, que possui uma indústria de guerra em pleno vapor desde o início da segunda guerra mundial, e que prosseguiu com a guerra fria até o ano de 1991. Sem guerras esta indústria quebra! Para resolver este problema econômico, os americanos vão buscar “inimigos” para reerguer o país, e descobrem em seu vizinho, o Canadá, um inimigo cheio de desejos imperialistas e pronto a executar várias ações terroristas! Em resumo: é preciso manter uma política de medo para que se justifiquem gastos, para que algumas empresas se mantenham produtivas e a economia a pleno vapor. Muitos poderosos lucram bilhões de dólares com a violência. Banqueiros, políticos, indústrias farmacêuticas, montadoras de veículos. Muitos são os que riem e fazem festa com dinheiro proveniente da violência. Ela é a alegria de um bom número de parlamentares e de seus colaboradores de campanha em várias partes do mundo. Vocês devem se lembrar do caso da compra de caças para a força aérea brasileira pelo governo Lula. Foi aberta uma espécie de licitação, em que alguns países apresentaram seus aviões. Os técnicos da Aeronáutica entenderam que os caça da Suécia eram os melhores, além de serem mais baratos, e dos suecos garantirem o repasse da tecnologia de construção destes caças. Mas, sem entender nada de aviões, o presidente Lula disse que preferia os caças franceses. Parece confuso não? O motivo deste despautério é devido à empresa francesa fabricante dos aviões de guerra estar quebrada, dela ter financiado a campanha do Sarkozy a presidência da França e o mesmo prometer dar apoio a Lula na insistente idéia de conseguir uma cadeira no conselho de segurança da ONU.    
Como todos podem ver se não houver violência, ou pelo menos a impressão de que esta existe, alguém pode perder muito dinheiro. Logo a divulgação de possíveis atos terroristas, de possíveis ataques da Al Kaida (acho que é assim que se escreve...) serão sempre necessários.
Garanto a vocês que existem muitas pessoas que estão rindo de toda esta onda de violência, e posso lhes garantir que não é nenhum traficante que mora nas favelas do Rio de Janeiro. Eu não entendo nada de bolsa de valores, mas sei que neste momento, as ações de empresas que fabricam armas no Brasil estão sendo muito valorizadas. E sei também que o povo dará seu aval para gastos bilionários em políticas de segurança pública, que são apenas ações momentâneas (apesar dos bilhões e bilhões gastos) e que não visam atacar a cerne dos problemas: a desigualdade social. Política de violência nunca resolverá o problema. Soldados na rua não resolvem o problema. A verdade é que o estado não quer resolver o problema. Está bom do jeito que está.
Assisti este mês ao filme tropa de elite II. Fiquei impressionado com a proximidade da realidade carioca. Não falo da violência e corrupção da polícia. Disso já estamos cansados. Falo do submundo do crime, que é freqüentado por aqueles que freqüentaram boas escolas, e que se dizem defensores da democracia e dos direitos do povo: sim. Nossos políticos. Qualquer semelhança com a realidade não é mera coincidência!
Infelizmente estamos sozinhos, e infelizmente, muito pouco nos é esclarecido. E eles, continuam a sorrir felizes, graças a todas as tragédias que em 99% dos casos só atingem a base da pirâmide: nós!
                                                                                Alex Grijó

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Os negros e suas lutas após a abolição.

Nas últimas décadas do século XIX, momento da derrocada final do regime escravocrata em nosso país, movimentos abolicionistas e projetos de lei foram acompanhados tanto por um processo de fuga em massa dos escravos, como por intensa mobilização popular, principalmente nas áreas urbanas. Mas as lutas por parte dos negros para alcançar a tão sonhada liberdade, não se iniciam neste final do século com a causa abolicionista. Este momento foi o de culminância de todas as suas lutas. A partir de 1888, o que passa a haver é uma busca para se obter maiores direitos políticos e participação dentro da sociedade constituída. Como dito anteriormente, leis foram criadas para atender as demandas daqueles que por séculos foram vítimas da escravidão. Logo após a abolição da escravatura no ano de 1888, vários grupos políticos formados por ex escravos, se unem para reivindicar o cumprimento destas leis que deveriam lhes trazer algumas reparações, como, por exemplo, o fundo de emancipação de 1871, que destinava recursos do governo imperial para as emancipações, e, principalmente no caso da parcela que se destinava a educação dos filhos dos recém libertos. Em abril de 1889, uma comissão formada por ex cativos do vale do Paraíba, Rio de Janeiro, enviam uma correspondência ao então Ministro da república, o Sr. Rui Barbosa, em que lhe pedem apoio para que tais questões pudessem ser postas em discussão, e conseqüentemente em prática. Um trecho da carta da comissão dizia o seguinte:
“Para fugir do grande perigo que corremos por falta de instrução, vimos pedi-la (educação) para nossos filhos e para que eles não ergam mão assassina para abater aqueles que querem a república, que é liberdade, igualdade e fraternidade”.

Podemos ver neste trecho, que aqueles que por muito tempo estiveram sob o jugo da escravidão, viam com certa clareza aquilo que a república “pretendia lhes oferecer”. Não possuo informações a respeito da resposta de Rui Barbosa á carta da comissão do vale do Paraíba, mas o que os fatos nos atestam é que independentemente de se a resposta Fora positiva ou negativa, as políticas públicas para este seguimento social foi algo inexistente.
As primeiras décadas da pós-emancipação foram decisivas para “o sentido de liberdade, cidadania e autonomia” para os recém libertos. A discussão girava em torno do sentido destas palavras para os negros. O que significaria liberdade? Gomes nos diz o seguinte:
“No mundo rural, migrações familiares alternavam-se com arranjos coletivos, e o status dos negros oscilava entre o de camponeses, parceiros e vadios, abrindo fronteiras ou fechando portas. Nas áreas urbanas, ao contrário do êxodo rural de uma suposta desqualificada massa negra alijada do mercado de trabalho, assistia-se ao ressurgimento de tradições operárias, em que o debate sobre raça e nação podia ser travado no braço.

Boa parte dos negros não vira mudanças significativas em suas vidas. Suas condições de trabalho pouco ou nada evoluíram. O que a abolição veio trazer inicialmente, fora apenas uma maior possibilidade de movimentação, de distanciamento dos locais onde viviam escravizados, de se tornarem “andarilhos da sobrevivência”.
Nos anos que se seguiram a abolição, houve uma enorme expectativa em torno das formas de controle da população negra recém liberta. Abolicionistas, fazendeiros e monarquistas se viam envoltos com tais questões. Trata-se de um momento em que os principais centros do país se encontram em ebulição. E é neste momento que novos personagens surgem na cena política. Gomes revela que a partir da criação da guarda negra, em fins de 1888, o movimento negro ganhou renovada visibilidade. Ruas e editoriais transformaram-se em palco de enfrentamentos políticos. A guarda esteve envolta em vários acontecimentos conflitantes durante o fim do império. Em Campinas, no ano de 1889, foram distribuídos panfletos em que se encontrava o título “Protestos dos homens de cor”, em que se lia entre outros assuntos, o seguinte:
“os libertos aqui reunidos em assembléia popular para tratarem do interesse de sua classe, vêm declarar que de modo algum concordam com a organização da guarda negra com o fim de defender o trono da princesa”.

Este grupo de pessoas sabia que a guarda negra estava sendo manipulada politicamente, e que a princesa Isabel não fora nenhuma “redentora” de sua raça. A abolição se deu através de um longo e complicado processo de lutas, com inúmeros atores, influências externas e internas, surgimento do modo de produção capitalista, que passa a gerar uma contradição com o capitalismo, e conseqüentemente de uma mudança nas ideologias predominantes até então. Desta forma, não se pode atribuir a princesa nenhuma honraria pelo acontecido. A mesma teve pouca, ou nenhuma influência no processo da lei áurea.
No alvorecer do século XX, os movimentos de mobilização encabeçados por lideranças negras e seus partidários, continuam sua jornada. A “imprensa negra” é a parte mais conhecida e citada nas primeiras décadas deste século. Esta imprensa procurava denunciar o preconceito e as condições de acesso a “cidadania” que foram impostas aos negros. Na maior parte foram publicações de vida curta, e que tiveram financiamento de jornalistas e gráficos negros. Seus principais objetivos eram refletir sobre a abolição e seus desdobramentos. Estes periódicos constituíram-se em instrumentos de comunicação entre vários setores da sociedade, como associações e entidades negras, grupos de intelectuais, que procuravam através destes instrumentos encontrar soluções para o problema negro.
A participação do negro na política brasileira no início do século XX, não esteve restrita aos periódicos, a atuação da guarda negra, ou a pura e simples panfletagem. Houve participação ativa também em sindicatos, cultos religiosos e locais de socialização, como lugares em que se praticavam esportes como o futebol, ou clubes de dança.
Apesar de tais acontecimentos, estes movimentos eram vistos como pouco organizados, sem definições claras e com pouca participação política efetiva. Gomes nos diz que não foram feitas pesquisas aprofundadas a respeito do assunto para se aceitar definitivamente tal afirmativa. O mesmo autor relata que a população negra não estava apática e nem ficou a esperar pelas políticas públicas, que pouco ou nada até então teriam feito, ou que pretendiam fazer em benefício do negro.
Posteriormente no ano de 1931, é criado mais um grupo de luta pelos direitos dos negros. Trata-se da Frente Negra Brasileira (FNB). Tal entidade conseguiu reunir grande número de participantes que, devido à situação em que se encontrava o país, com crises econômicas, principalmente devido à quebra da bolsa de Nova York dois anos antes, em 1929, levava a grande massa que se encontrava em dificuldades a esperar melhorias. Os negros, já mais do que acostumados a dificuldades, passam a esperar mais do que ninguém por mudanças. Mas, veremos que estas mudanças ainda iriam demorar mais algum tempo.
Na década de 1930, mais especificamente no ano de 1937, que tem como acontecimento histórico de maior repercussão no país a instauração do estado novo de Getúlio Vargas, que, para se perpetuar como governante usa como pretexto uma possível tentativa de tomada de poder por parte dos comunistas, e a partir de então aplica um golpe e se mantém no comando da república. Entre seus atos ditatoriais, o que vai de encontro à luta do movimento negro é a dissolução dos partidos políticos, que irá afetar diretamente a FNB. A imposição do estado Varguista marca o fim ou pelo menos a interrupção de um momento de intensa mobilização política nas comunidades negras do Brasil. Os movimentos sociais são obrigados a conter a maior parte de suas ações devido à repressão promovida pelo governo Vargas. A FNB tinha até então atuação destacada na luta contra discriminação racial. Há que se ressaltar que as sociedades negras não desaparecem completamente neste período. Clubes sociais e sociedades de dança de cunho político continuam a operar, e uma delas, a sociedade José do Patrocínio obtêm sucesso ao solicitar ao governo Vargas à proibição de anúncios em jornais que enfatizassem a questão de cor e raça para a concessão de empregos.
Outro movimento que deve ser destacado, e que conseguiu se manter ativo dentro deste período de privação de direitos, foi o promovido por Abdias do Nascimento e seu teatro experimental do negro, que criado no ano de 1944, buscava conscientizar os afro descendentes sobre o preconceito racial e o papel do negro dentro da sociedade a partir de ações sócio-culturais. Estes movimentos foram alvos de inúmeros ataques de outros órgãos de comunicação e da elite socialmente constituída no país. O jornal Correio Paulistano em sua edição de 16 de julho de 1950 exclamava:
Teatro negro, jornal negro, clube de negros... Agora já se falam mesmo em candidatos negros ao pleito de outubro. Pode-se imaginar um movimento pior e mais danoso ao espírito da nossa formação democrática? Vale a pena combatê-lo desde logo, sem prejuízo dos direitos que os homens de cor reclamam e nunca lhes foram dados. Do contrário, em vez de preconceito de brancos paradoxalmente, teremos preconceito de negros. A tais extremos conduzem não ao racismo (que não existe entre nós), mas o espírito de imitação [supostamente do movimento negro nos Estados Unidos].

Bem, fico um pouco confuso com tanta contradição dentro de um texto com um único e mísero parágrafo. Para tal editor, ou editores, não é possível a organização de movimentos de grupos excluídos socialmente. Não é possível a idéia de um candidato negro a um cargo político. Jornais de negros? Clubes? Nada disto. Mas mesmo assim o editor diz que em nosso país não há racismo. Que não somos racistas. É confuso, mas, ao mesmo tempo, nos leva a questionar a própria idéia de fim da escravidão, de democracia e República. Afinal, a democracia não fala em governo do povo pelo povo? Ou os negros não faziam parte do povo? E a república. Esta não diz tratar de “igualdade, fraternidade e liberdade”? Ou será que não vivíamos em uma república democrática? É fato que estávamos vivendo sob uma ditadura; a chamada era Vargas. Correto. Mas será que a república democrática do período anterior a 1937 era diferente? Posso lhes dizer com ampla margem de acerto que os negros eram ainda mais discriminados.
Observação importante a ser feita é referente à repercussão que os movimentos sociais negros vinham causando. Para a elite social dominante, se tratava apenas de uma celeuma que devia ser contida o mais rapidamente, por não ser possível se justificar tais movimentos dentro de uma sociedade sem “preconceitos”. Podemos entender que estas organizações negras se encontravam em evidência e causando certo incômodo para o status quo brasileiro.
Dando prosseguimento a nossa análise, veremos ainda nos anos 1950 a fundação da associação cultural do negro, com uma atitude de reivindicação ideológica, que buscava desenvolver e conscientizar jovens negros utilizando como instrumento, tanto o esporte quanto a cultura. Esta associação teve vida curta, apesar de um início entusiasmado. Estes anos 1950, serão de intensos acontecimentos. No que diz respeito ao problema negro, gostaria de citar a lei Afonso Arinos de 1951, que veio para tentar conter o antagonismo racial que assolava nossa sociedade havia séculos. Esta lei tornou ilegal a discriminação racial nos serviços, na educação e em empregos públicos. Afonso Arinos alegou que criara tal projeto devido à discriminação que seu motorista particular havia sofrido. Mas o que de fato ocorreu foi um episódio com uma bailarina afro-americana que passou por vários constrangimentos em um hotel na cidade de São Paulo, e que teve grande repercussão tanto na imprensa nacional quanto internacional.
Como já citado anteriormente, neste período os movimentos sociais passam por sérios problemas, e acabam por ter suas atividades sociais e políticas cerceadas. Como proposta política, o movimento negro só voltaria à tona na década de 1970, mais especificamente no ano de 78, quando um ato público na cidade de São Paulo, contando com grande número de manifestantes que protestavam pela morte de quatro jovens em um clube da capital paulista. A partir de tal ato, surge o Movimento Negro Unificado contra a discriminação racial (MNU). Este movimento dará início a vários debates sobre a temática negra, e será ponto de partida para a criação, no ano de 1984, do primeiro órgão público de apoio aos movimentos sociais afro brasileiros: o Conselho de Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra, no estado de São Paulo.
Na década de 1980 outras importantes conquistas foram alcançadas. Instituições e leis como a fundação Palmares, no Ministério da Cultura, o conselho de participação e desenvolvimento da comunidade negra em São Paulo, a secretaria Extraordinária de Defesa e Promoção das Populações Afro-brasileiras no Rio de Janeiro, e o conselho e a lei Caó, que são exemplos de maior vulto das conquistas do movimento negro nesta década. Aliás, a criação da lei Caó, ou lei número 7.716 se deu após muitas lutas para sua aprovação. Como em todos os momentos da luta negra neste país, este não fora também nada fácil.
Já na década de 1990, o movimento negro passa a contar com um movimento de apoio a suas lutas: o movimento das centrais sindicais. Estes movimentos que buscavam promover variadas mudanças dentro de nossa sociedade, passam a colocar em suas pautas a questão racial, reconhecendo sua importância para a busca de um desenvolvimento social menos excludente.
Podemos perceber com certa clareza, que a luta do movimento negro enquanto entidade política consegue a partir de meados do século XIX, obter inúmeras conquistas. Falo do século XIX por entender que tal movimento se inicia neste período, ou quem sabe séculos antes, bem antes da guarda negra ou dos movimentos abolicionistas. Não é possível desvencilhar determinados atos de grupos de escravizados, das lutas que irão se desenrolar no século seguinte. Vários foram os meios utilizados pelos negros para alcançar seus objetivos, e as lutas travadas por grupos organizados, que promoveram revoltas, acionaram a justiça e reivindicaram junto a seus senhores melhores condições, foram atos que considero como a gênese constitutiva dos movimentos negros do século XX.
Concretamente, é somente a partir do século XXI que se começa a serem tomadas medidas efetivas de políticas raciais. Temos uma pequena idéia de tudo o que já se passou no decorrer da História das lutas sociais por melhores condições e diminuição das injustiças. Sabemos que o caminho a ser percorrido é ainda maior do que o que ficou para trás. Mas se ao fim deste caminho não encontrarmos aquilo que desejamos, acredito que ao menos teremos diminuído um pouco da distância.
                                                                                                   Alex Grijó

sábado, 20 de novembro de 2010

Onde está nosso tempo?

Ao assistir uma entrevista do jornalista e diretor Alberto Villas falando das mudanças em nosso cotidiano e das modificações que vão fazendo muitas frases sumirem do nosso vocabulário, achei interessante quando foi abordada a nossa falta de tempo para tudo hoje em dia, já que muitas coisas foram criadas para facilitar a nossa vida e deveríamos estar com mais disponibilidade e não tão ocupados como nos encontramos.
A humanidade está cada vez mais preocupada em ganhar tempo, mas apesar de criar de tudo para ter menos trabalho, ainda continuamos super atarefados com nossos afazeres do dia-a-dia. Onde está à ociosidade do tempo em que escrevíamos cartas ao invés de e-mails? Pois quando usávamos esse meio de correspondência, entre a escrita, a postagem e a resposta levavam pelo menos uns quinze dias. Hoje se alguém não responde nossos e-mails em alguns minutos, já ficamos aflito com uma baita ansiedade.
Com o telefone não é diferente, lembro quando tínhamos que comprar fichas, procurar um orelhão que estivesse funcionando,- “o que não mudou nada com chegada dos cartões telefônicos”- para tentar se comunicar com alguém. Hoje não precisamos nem levantar de onde estamos para fazer uma ligação, basta enfiar a mão no bolso que com certeza iremos achar um celular, afinal neste país tem mais celular do que gente e então podemos conversar com pessoas de outra cidade, Estado ou até outro continente.
Estamos ganhando tempo também com o transporte. Antes para fazer uma viagem de 300 km, perderíamos uma noite inteira mau acomodado em algum trem. Hoje de ônibus levamos menos de 3 horas e com a popularização do transporte aéreo muito menos tempo.
Até nossa alimentação está mais veloz, não temos mais que matar a galinha e depois preparar para o almoço de domingo, tudo está semi-pronto, não precisamos cozinhar mais nada, é só colocar no micro-ondas e esperar alguns minutinhos.
Lembro-me de quando morava no interior e não tinha luz elétrica e nem televisão, dormíamos com as galinhas como se diz na roça, hoje com a expansão da eletricidade, nossos dias ficaram bem maiores e mesmo assim continuamos ocupadíssimos. Onde foi parar todo esse tempo que estamos economizando? Será que está no trabalho? Talvez, pois pode faltar tempo para tudo, menos para o nosso ganha pão. Até porque quando trabalhamos em um serviço que nos sobra tempo, o que fazemos? Arrumamos outro serviço para completar o orçamento. Acho que está aí a explicação. O capitalismo comeu todo o nosso tempo, para atender a lei do consumismo estamos trabalhando cada vez mais. É isso.

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

A corrupção de ontem e de hoje

Na semana que passou aconteceu a decisão de um dos campeonatos de futebol amadores da cidade. Um fato interessante se deu com relação a atitude tomada pelos membros de uma das equipes, que resolveram protestar, segundo eles, contra a corrupção que assola o município, e que os tem lhes atingido diretamente(?). Eles questionaram o repasse, segundo eles de 450 mil reais destinados ao clube, e que ninguém sabe para onde foi( ou sabe?). Escreveram faixas, camisetas, placas, e coros entoados de “ladrão”, para o responsável pelo uso da verba, que envergonhado (será?) preferiu sair de fininho com o rabo entre as pernas sem se pronunciar. 450 mil é muito dinheiro para um simples time amador, que, nem redes ou bolas possui. Há alguma coisa errada nisto.
Mas se há alguma coisa errada, não está apenas na postura suja do administrador do dinheiro. Está também nas prioridades dos atletas peladeiros do fim de semana daquele “clube”. Por que será que só protestam quando se trata de roubo no futebol. Só chamam de ladrão o árbitro de futebol (que eles chamam de juiz) e não os juízes de verdade e toda a sua conivência com a podridão pública? Por que não reclamam da falta de ambulâncias, ou de remédios, ou de merenda escolar? Por que não reclamam das centenas de pessoas que eles mesmos conhecem, que mamam nas tetas do governo municipal e estadual, sem saber mal soletrar seus nomes? É por que neste caso, não se trata de coisas tão importantes quanto o futebol. E em muitos casos, muitos dos que se manifestam contra os desvios no futebol (no futebol não!) gostariam de receber algum que estivesse sendo desviado de algum outro órgão público.
Outra coisa surpreendente se dá com relação ao enriquecimento de determinados políticos. Tudo o que possuem é fruto de roubo. Fruto de sujeira da mais vil possível, mas mesmo assim são tratados com tanto respeito. Andam com os narizes tão empinados, desfilando em carros comprados com nosso dinheiro (ou alugados com nosso dinheiro) como se isto fosse a coisa mais normal do mundo (As vezes eu acho que é).
Em “Vida e morte de M.J.Gonzaga de Sá”, Lima Barreto escreveu: Nunca houve tempo em que se inventassem com tanta perfeição tantas ladroeiras legais. “A fortuna particular de alguns, em menos de dez anos, quase que quintuplicou; mas o estado, os pequenos burgueses e o povo, pouco a pouco, foram caindo na miséria mais atroz.”
O referido texto de Lima Barreto se refere a o início do século passado e a recém inaugurada República do Brasil. O que vemos nestas palavras? Semelhanças com o que acontece em nossa cidade? Uma corrupção que prossegue ininterruptamente há séculos? Triste nossa situação. Pobre de nosso povo, enterrado até o pescoço na ignorância, acreditando que uma bola Val mais que uma ambulância ( não era para rimar...). Abraços...                                                                       Alex Grijó

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Escravos de todo mundo     
      O Brasil foi um dos primeiros países americanos a conhecer a escravidão e o último a aboli-la.[1] Durante quase quatrocentos anos, indígenas, e posteriormente negros africanos, foram utilizados como instrumentos de produção de riquezas, através da exploração de sua força e energia. Segundo Emilia Viotti, a escravização do negro africano foi à fórmula encontrada pelos europeus para a colonização do novo mundo.[2] No caso do Brasil, constituído como um apêndice da metrópole portuguesa, incorporado ao novo circuito econômico como uma economia voltada para a agro-exportação, era preciso atender a demanda daqueles que para cá vieram se instalar e produzir gêneros variados, além de explorar os recursos existentes. Para isto, fazia-se necessário um vultoso contingente de braços para o trabalho nas lavouras, que de acordo com Florestan Fernandes seria utilizado como uma modalidade de energia que podia ser concentrada e utilizada intensivamente através da organização social do trabalho escravo como se o organismo humano fosse uma máquina.[3]                       
            A violência do regime não pode ser contestada. A questão é que não tivemos apenas estes fatos. Como bem observa Chalhoub quando relata que a “violência da escravidão não transformava os negros em seres incapazes de ação autonômica, nem em passivos receptores de valores senhoriais, tampouco em rebeldes valorosos e indomáveis.[4]
Vários estudos mais recentes têm demonstrado que estas resistências devem ser entendidas não como “passivas”, mas sim como “uma das faces das complexas lutas vivenciadas pelos escravos e De acordo com Flávio Gomes passa a haver uma contestação das concepções que viam as relações senhor/escravo marcadas tão somente por uma visão paternalista da escravidão. [5] Há uma maior ênfase na descrição dos quilombos e seus líderes de caráter revolucionário com maior consciência de suas ações, além da análise de outras formas de resistência, como determinadas negociações buscando melhorias em sua vida cotidiana, que até então foram descritas como passivas e de caráter histórico desmerecido que tinha como contraponto a reelaboração permanente das relações com seus senhores”.[6]
O que se pode entender destas formas de resistência, é que através delas, os escravos buscavam se reconstituir como pessoas, alterando, modificando e adequando a dominação senhorial na tentativa de reconstruírem suas vidas. Trata-se de novos meios para enfrentar o sistema, que não se limitou a insurgências e fugas. Gomes relata, por exemplo, que negros escravos no Caribe estavam muito bem informados a respeito das discussões no parlamento inglês,e tentavam na medida do possível, tirar proveito de tal situação, a partir de suas próprias lógicas”.[7]
Outra questão interessante é a ligação que se faz de imediato quando se fala de escravidão. Logo nos vem a cabeça o negro e a escravidão. Trata-se de um grande erro, que é parte integrante do imaginário da maior parte das pessoas. O fato é que a escravidão existe desde tempos remotos, e foi muito difundida na antiguidade, tanto na Eurásia, quanto na África. Na Europa podemos citar a Grécia antiga e principalmente o Império Romano, como povos que tinham este regime vinculado as suas práticas cotidianas.
Para termos uma idéia de como o comércio de escravos pode ter seguido um caminho diferente daquele que conhecemos, que se dirigia da África para a Europa, a informação de Maestri de que no começo do século XVII, cerca de 250 mil europeus viviam como escravos na África do norte é extremamente reveladora.[8] Esta afirmativa demonstra que o fluxo de escravos em determinados momentos da história seguiu caminho inverso, indo da Europa para África. Os gregos que também já utilizavam a escravidão, e esta se via inserida em seu cotidiano sendo definida por leis, tinham nas obras de seus grandes pensadores como, por exemplo, Aristóteles (384-322 a.C.) sua afirmação ideológica. Este filósofo em uma de suas principais obras nos diz que há na “espécie humana indivíduos tão inferiores a outros como o corpo o é em relação á alma... Partindo dos nossos princípios, tais indivíduos são destinados, por natureza á escravidão; porque, para eles, nada é mais fácil do que obedecer”.[9] Em “A política”, Aristóteles não faz menção ao negro africano. Este filósofo ao descrever a escravidão e o escravo, em nenhuma página cita diretamente o negro. A escravidão no mundo antigo e neste período em que este autor escreve se insere em um momento em que as relações entre estes continentes - África e Europa- ainda não haviam se estreitado.[10]Logo, a difusão da relação entre a África e a escravidão, assim como o negro e o cativeiro são criações modernas, bem mais recentes, que devido à legitimação de um sistema, fez-se necessário povoar o imaginário social com a “certeza” da aptidão dos povos africanos para o trabalho escravo e de sua “inferioridade” como “raça”. Quando falo de criações modernas, não quero dizer que a escravização de pessoas naquele continente seja posterior ao século XVI. A ocorrência da escravidão na África é anterior a chegada dos europeus. O que ocorre é que a partir da intensificação dos contatos com os mercadores da Europa, este sistema será ampliado em uma escala superior.
A escravidão na África, assim como em várias outras regiões do mundo, existiu por muitos séculos e razões diferentes. Os motivos para levar uma pessoa ao cativeiro poderiam variar de época e lugar. Em África, Inimigos derrotados eram convertidos em escravos, bem como pessoas endividadas ou condenadas por crimes.[11] Neste continente, ao contrário da Europa, os cativos eram a única forma de propriedade privada lucrativa reconhecida pelas leis locais. Já na Europa era a posse de terras a principal forma de propriedade privada geradora de lucros, e por este motivo a escravidão ocupava na Europa uma posição inferior.[12] Esta mesma diferença que colocava o escravo como forma de produção de riquezas, foi um dos fatores que levaram a disseminação da escravidão na África. Podemos dizer que África e Europa possuíam sistemas diferentes sem que se possa dizer que o sistema social africano fosse inferior ou retrógrado ao europeu, mas somente legalmente divergente.[13]
Entre estes dois sistemas, a escravidão clássica e a moderna, encontraremos mais diferenças do que similaridades, mas o cerne do sistema que era a privação de liberdade será uma constante em ambos.[14]
 A partir de 1650 o comércio de escravos na África tende a ter um maior desenvolvimento por conta da intensificação dos contatos com os europeus, que passam a forçar os africanos a exceder sua capacidade de fornecimento de cativos, num momento em que as colônias da Europa na América passaram a necessitar cada vez mais de mão de obra para sua produção agrícola nas regiões caribenhas.[15] Este aumento na intensidade do tráfico provocou uma diminuição demográfica no continente já no fim do século XVIII. O inverso desta diminuição fora a presença maciça de africanos nas Américas, que passaram a ter uma influência importante no desenvolvimento do chamado novo mundo. 
Esta presença fica evidente quando analisamos a economia americana, que teve como base na maior parte de sua história a utilização da mão de obra negra africana escravizada, que por conseqüência trouxe influências culturais que ajudaram a moldar a religião, a filosofia, a culinária, a língua e a própria aparência a partir da grande miscigenação ocorrida entre europeus, indígenas e os próprios africanos. A atuação destes como força de trabalho foi crucial para delinear sua influência no mundo atlântico. [16] Com relação a estas influências na cultura americana, Thornton nos diz que os africanos tiveram-na em grau superior a dos nativos da América.[17]  Grande abraço a todos e viva a semana nacional da consciência negra!
                                                            Alex Grijó


[1] MAESTRI, Mário. O escravismo colonial/São Paulo: Atual, 1994, pp.5.
[2][2] VIOTTI, Emília. História Geral da Civilização Brasileira. Tomo II – O Brasil monárquico, Bertrand Brasil, 2004, pp.135.
[3] IANNI, Octavio. Florestan Fernandes/ – 1ªedição, São Paulo: Ática, 2008, pp.230.
[4] CHALHOUB, Sidney. Op.cit, pp.43.                                                                         
[5] GOMES, Flávio dos Santos. Histórias de quilombolas: Mocambos e comunidades de senzalas no Rio de Janeiro, século XIX. Rio de Janeiro, Arquivo Nacional, 1995,pp.17-19.
[6] Idem, pp.30-31.
[7] Ibdem, pp.17.
[8] Idem.p.10.
[9] ARISTÓTELES. A política. São Paulo. Editora Escala.s/d, pp.19.
[10] THORNTON nos diz que as intensas navegações no início do século XV levaram a interação de quatro continentes quando antes havia pouca ou nenhuma comunicação. THORTON, John Kelly. A África e os africanos na formação do mundo Atlântico, 1400 – 1800/Rio de Janeiro: Elsevier, 2004.p.41.
[11] MAGNOLI, Demétrio. Uma gota de sangue: história do pensamento racial. São Paulo: Contexto, 2009.p.195-198.
[12] THORNTON, John Kelly. Op.cit, p.123 – 125.
[13] Idem. Op. cit.p.127.
[14] FLORENZANO, Maria Beatriz B. O mundo antigo: Economia e sociedade (Grécia e Roma) São Paulo, Ed. Brasiliense, 1986, p.68-71.
[15] THORNTON, John. Op.cit, p.174-175.
[16] Idem, p.190-191.
[17] Ibdem, p.191.

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Deveriam nos agradecer de joelhos...

Deveriam nos agradecer de joelhos”...
Assisti esta semana uma entrevista do General Leônidas Pires Gonçalves concedida ao jornalista Geneton Morais Neto no programa Dossiê Globonews. O general Leônidas fora ministro do exército, ex chefe do DOI-CODI, que era um dos órgãos repressivos do regime golpista de 1964. Vale a pena ler e ouvir as declarações do general. Os pontos que mais me chamaram a atenção foram os seguintes.
Para o general todas as medidas do governo estavam dentro da legalidade. “éramos civilizados. As medidas do governo eram civilizadas.” A respeito dos que fugiram do país e se exilaram por medo de serem assassinados, ou por que tiveram direitos políticos cassados, sendo acusados de subversivos o general disse: “os que deixara o país o fizeram por livre e espontânea vontade. Saíram por que quiseram. Eram fugitivos”. Gostaria que o jornalista perguntasse a respeito dos milhares de desaparecidos durante o período. Sobre todos os torturados pela polícia que nunca mais voltaram para casa. Infelizmente esta pergunta não pode ser feita.
Sobre os meios utilizados para conseguir determinadas informações, o general disse que chegou a pagar por informações a integrantes do PCB, que por dinheiro delataram seus companheiros.” Paguei 150 mil a integrantes do partido comunista para que delatassem companheiros”. Nesta operação em que o general disse ter pago pelas informações, morreram três integrantes do PCB no bairro da Lapa, onde ficava a sede do partido. O general disse ainda que em seu departamento nunca houve tortura, e que pelos outros não podia falar. “hoje todo mundo diz que foi torturado para receber indenização. Depois, mudando um pouco o discurso disse Leônidas:”Se houve tortura, foi muito pouca. Pegaram uma formiga e colocaram num telescópio. Estávamos defendendo o país, e não interesses próprios”.
Sobre a morte do jornalista Wladimir Herzog, que fora chamado para depor e poucas horas depois estava morto, e que segundo a policia o mesmo cometera suicídio, o general Leônidas disse o seguinte: foi suicídio. Ele não foi torturado. Estava cheio de medo. Preocupado.
Todos os problemas ocorridos na ocasião eram culpa dos subversivos:” vivamos uma guerra iniciada por eles”.
Para o general, os atuais governantes do país deveriam agradecer aos militares de joelhos pela “revolução de 1964”. “Nós vencemos a guerra. A democracia de hoje é o que queríamos!”
Sobre suas orientações a seus subordinados:” atirem para matar. Mas não cometam arbitrariedades”. E sobre seus comandados:” o soldado é um cidadão de uniforme para o exercício cívico da violência”.
Para encerrar o general disse que o ocorrido fora a vontade do povo. “
O povo foi à rua pedir a revolução!”(o general fala da marcha com Jesus pela família organizada pela igreja católica contra o governo de Jango).
Cada um que tire suas conclusões. “Tá entendido!”. Grande abraço.

terça-feira, 16 de novembro de 2010

E ISTO, CHEIRA A QUÊ?

Hoje pela manhã, quando me encontrava no ponto de ônibus para ir ao trabalho, me veio de encontro uma senhora desesperada me pedindo o telefone, pois sua filha se encontrava em casa passando mal, tem câncer, e ao chegar ao posto de saúde, não havia ambulância. É algo triste. me fez lembrar outros acontecimentos recentes que eu mesmo presenciei, e que como neste caso, não passam de total descaso das autoridades. Ocorreu um acidente entre os distritos de Frade e Sana, recebí uma ligação pedindo para que entrasse em contato com o posto de saúde do Frade requisitando a ambulância. Fiz o contato. Não havia o veículo. Fiz contato com o posto de saúde de Glicério, que informou que seus veículos estavam quebrados. Fiz contato com o Hospital da serra, e recebi a informação anterior. a atendente me disse que tentaria conseguir uma ambulância em outro distrito, e pediu para que eu aguardasse. Por mim tudo bem, não era eu que estava na estrada mesmo. minha cama estava macia e quente, e também tenho plano de saúde, então...(acho que é mais ou menos asim que pensam nossas autoridades.) Por que isto ocorre? Vários motivos, mas aponto a questão dos lobbys para as empresas que vendem plano de saúde como um dos responsáveis por estas tragédias cotidianas. Afinal, se a saúde pública caminhasse da maneira correta, para que plano de saúde? já repararam que os mesmos médicos que nos atendem nos postos da vida, são os mesmos que nos atendem nos hospitais privados? mas com uma educação bem diferenciada? Outro fato que não posso deixar de  comentar, foi o ocorrido com meu pai no mês passado. Ele precisou de atendimento e o levei na recém inaugurada UPA do governo do estado. Bem, só serviu para encaminhá-lo para os velhos postos de saúde(ou de doença) da cidade. se soubesse que aquilo era só para encaminhar para outro posto não teria ido lá. Pura perda de tempo. Ao chegar ao posto Jorge Caldas recebí a informação de que só voltariam a marcar fichas no próximo ano, e ainda estávamos em outubro! Ai fico pensando: nossos parlamentares estão brigando para que nosso estado e nosso municipio não percam os Royallts do petróleo, por que se isso ocorrer, nosso sistema de saúde e outros serviços básicos ficarão comprometidos. Estão de sacanagem né? Só pode. Se ficar mais comprometido do que isto aí, é melhor fechar tudo, por que se não vai haver duas entradas no posto. de um lado emergência, e do outro carne fresquinha abatida todos os dias e de excelente procedência! Fica aqui meu protesto( que provavelmente não vai valer de nada), e minhas sinceras condolências a todos os que necessitam do poder público, por que afinal, o poder pode ser público, mas seu direcionamento é sempre privado. Grande abraço.
                                                                                                   Alex Grijó

domingo, 14 de novembro de 2010

"ISTO CHEIRA A DECOMPOSIÇÃO CADAVÉRICA"...

A frase acima é atribuída ao ilustríssimo Rui Barbosa, fazendo uma referência ao estado em que se encontrava a monarquia as vésperas de sua derrubada no dia 15 de novembro de 1889. De fato tratava-se de um momento conturbado. A república era um fato que já assolava todo o continente, e o Brasil era a única monarquia nas Américas desde sempre, e naquele momento, mais do que moribunda.
As convulsões sociais no Brasil eram enormes. Republicanos, monarquistas e membros da guarda negra- adoradores da princesa Isabel, que alguns acreditavam ser a “redentora de sua raça”- se digladiavam pelas ruas. Na intimidade da família real, havia a espera pela morte de Pedro II, fato que causava conflitos por conta da sucessão disputada entre Isabel e Pedro Augusto, filho de Leopoldina, outra filha do imperador já falecida. Os militares se encontravam insatisfeitos com o pouco prestígio que detinham no governo. Acreditavam que após a vitória na guerra do Paraguai, teriam mais destaque na vida pública do país, fato que não ocorreu. Segundo Mary Del Priori, “falava-se muito a respeito da substituição dos batalhões de Corte pela Guarda Nacional, e até que escravos fiéis a princesa atacariam quartéis onde houvesse militares favoráveis a causa republicana.” Havia também os senhores de escravos que não digeriram a abolição da escravatura, e começam a retirar seu apoio à família real, além de conflitos com a igreja católica, que também perdera com a abolição, afinal, era uma das maiores possuidoras de escravos do país.
O caso da igreja era bem mais complexo. Havia a questão do padroado em que o imperador era quem nomeava os padres e lhes direcionava as paróquias. Para se conseguir uma paróquia importante, era necessário o contato com famílias importantes, próximas ou pertencentes a Corte. Logo, havia uma dependência muito grande do monarca. Logicamente que havia um grande descontentamento entre os que não eram agraciados com esta ou aquela paróquia. Havia também por parte da igreja a crítica à participação dos maçons no governo, que entre outras coisas, pregavam a separação entre estado e religião.
As idéias positivistas trazidas por membros da elite do país, que haviam ido a Europa estudar e voltaram trazendo novas visões de mundo começaram a se disseminar entre vários círculos do país, principalmente entre os mais intelectualizados.
Com isto, a Corte se afastava a cada dia das elites do país, tendo em contrapartida uma maior aproximação das camadas populares, principalmente devido a abolição da escravatura. Este ato irá fazer com o último sustentáculo da monarquia se afastasse: os senhores de escravos. Pronto. Não havia mais por que continuar com a monarquia no país. Os últimos interessados em sua manutenção haviam se retirado.
Apesar de tudo isto, mesmo com toda a convulsão republicana, a monarquia isolada dava festas. De outro lado, os militares tramavam. Reunidos no Campo de Santana, no centro da cidade do Rio de Janeiro, Deodoro, Constant, Rui Barbosa, Quintino Bocaiúva entre outros, chegavam a uma conclusão: era chegada a hora. Deodoro não estava bem de saúde. “Concordou antes dizendo:” eu queria carregar o caixão do imperador, a quem já está muito idoso e a quem respeito muito “(apud, PRIORI, 2007). Em seguida disse: “não há mais o que esperar! Façamos a república!”
Elio Chaves Flores narra os fatos ocorridos logo após a proclamação da república a quinze de novembro de 1889 pelo marechal Deodoro.
O autor faz uma alusão no início de seu texto, ao romance Esaú e Jacó de Machado de Assis publicado no ano de 1904, em que ambos são apaixonados pela mesma mulher. Os dois personagens principais do texto divergem na política, sendo um monarquista e o outro republicano, e ambos se mostram perplexos de como o império do Brasil se transformou em república.
Elio Chaves utiliza-se deste texto para iniciar seu relato, pois Machado de Assis é contemporâneo aos acontecimentos, e a perplexidade dos personagens da narrativa são possivelmente os sentimentos mais expressados á época, pelo menos por aqueles que estavam envolvidos com os rumos políticos do país.
É algo comum ao estudarmos o período inicial republicano, as referências a respeito do ocorrido, a república que havia sido instalada. Muitos diziam que “esta”, não era a república que havíamos sonhado.
O início da república brasileira ou república velha, como ficou conhecido, é um período de consolidação de determinadas normas, de mudanças, de se deixar para traz tudo o que viesse a ser lembrado ou fizesse alguma referência ao regime recentemente derrubado, ou seja, o regime monárquico. Um momento, segundo o autor, de consolidação de simbologias e mitos que passariam a fazer parte do imaginário popular sempre que se fizesse alguma referência à república. Falo de seus” heróis” e de seus atos de heroísmo, como o caso de Tiradentes, o mártir da independência, que dificilmente poderia ter sido líder do movimento da inconfidência mineira, visto que no grupo de revoltosos havia vários políticos influentes, coronéis e tenentes-coronéis, grandes fazendeiros entre outros. E pode-se entender o porquê de somente o alferes ter sido condenado à forca: era provavelmente o que menos influência possuía, pego como bode expiatório e utilizado como exemplo para outros possíveis revoltosos.
Inicialmente, de acordo com o texto de Élio Chaves, haveria uma contradição entre monarquia e república, em que a monarquia praticava a desigualdade, “em que somente os grandes homens têm as virtudes da honra e do melhoramento material e espiritual”. Os republicanos viriam para desfazer estas desigualdades, “acreditando” que esta seria o exercício do bem comum, do “respeito” a coisa pública. O que se pôde ver na prática foi algo bem diferente. A república não aboliu o direito dos monarquistas. Flores destaca que até pensões a monarquistas continuarão sendo pagas e muitos destes monarquistas permaneceram no governo republicano.
A república brasileira se inicia nas mãos de militares, é proclamada por um deles, e os dois primeiros governos ficam em suas mãos.
Flores ao analisar um texto de Antonio Prado em que o mesmo diz que a tomada de poder pelos militares, teve a aceitação popular, questiona famosa observação de Aristides Lobo que disse que a população assistiu ao quinze de novembro “bestializada, atônita, surpresa, sem conhecer o que significava”. Creio eu que realmente a maior parte da população não entendeu o que estava se passando. Como nos dias atuais, a alienação é um dos principais adjetivos dados ao povo brasileiro. Mas Flores apresenta a afirmação logo em seguida, dizendo que atualmente tem surgido novos estudos em que o povo aparece com atitudes políticas que não estariam nada próximas da passividade.
O governo republicano surge como sendo um alvo de grandes questionamentos principalmente por parte daqueles que estavam na monarquia e perderam com o seu fim. O governo do marechal Deodoro assume já se parecendo com uma ditadura, e não com um governo republicano. Deodoro viola a constituição que ele mesmo ajudara a criar. Segundo Flores este ato fez com que grupos organizados se unissem para resistir aos atos de força deste governo.
Havia entre os deodoristas, grupos que acreditavam que a república instaurada seria à volta por cima dos militares, que durante o período monárquico, sempre estivera à margem dos acontecimentos. A substituição de Deodoro por Floriano Peixoto, segundo Flores, apenas aumentaria a crise institucional e o radicalismo dos grupos envolvidos que se tornaria intenso até os contornos da guerra civil.
Os governos militares do início da república, como confirma Flores, foram de intensos embates políticos, conflitos entre monarquistas ferrenhos e republicanos, que segundo alguns, não tinham princípios para governar. O governo de Floriano Peixoto será ainda mais conflituoso, com uma guerra civil estourando em diversas regiões do país, principalmente no sul, onde Júlio de Castilhos usará mão de ferro para conter as revoltas. As discussões dentro do governo giravam em torno de quase todos os assuntos, inclusive sobre quem seria o fundador da república: Benjamim Constant ou Deodoro?
Os conflitos logo explodem no país, entre federalistas e republicanos radicais. Vários problemas se sucedem e o ano e 1892, “findaria em ebulição”: Acontecimentos belicistas no Rio Grande do Sul; a crise econômica financeira com a desvalorização do meio circulante e a retração do crédito; agitação social e política no distrito federal e em outros estados, indisciplina na armada, e vários outros problemas que fazem com que este período seja um dos mais turbulentos de nossa história até então.
No ano de 1893, a situação se tornou tão insustentável, que acabou por evoluir para a guerra civil. Neste momento tivemos o acontecimento conhecido como revolta da armada, devido à grande influência que a monarquia exercia sobre a marinha, e que seria seu grande reduto. Os conflitos ocorridos neste período foram muito mais graves do que aqueles que ocorreram, por exemplo, durante o golpe militar de 1964, e por acaso é um período que me parece ser menos estudado. Apesar das torturas, dos desaparecimentos e falta de liberdade, os acontecimentos do início da república são de uma selvageria assustadora, principalmente a partir da revolução federalista, em que a prática da degola foi algo utilizado em demasia pelas tropas tanto legalistas, quanto federalistas.
Flores “relata que os dois acontecimentos, a revolta da armada e a revolução federalista” tinham apenas um fator em comum, a hostilidade ao legalismo florianista.” A revolução federalista prossegue até o ano de 1895 em diversos pontos do estado Rio grandense, leva milhares de pessoas a morte, e os relatos que se tem destes acontecimentos nos mostram uma sucessão de horrores dignos de filmes de terror. Flores também ressalta que a prática da degola, extrapolaria a sua própria cronologia, chegando a um outro acontecimento que tanto mancha a história do exército, quanto do nosso próprio país; Canudos.
A república que se consolidaria após estes acontecimentos, seria a república dos coronéis, dos barões do café, apenas visando seus interesses e buscando uma república que atendesse a os interesses de todos os iguais. Iguais a eles mesmos. Iguais aos políticos de hoje em dia. Iguais aos coronéis que todos nós conhecemos bem, que nada mais são do que os netos e bisnetos daqueles de outrora. No mais, neste dia 15 deixo um viva! Viva A republiqueta Brasil! Grande abraço a todos.
                                                                                Alex Grijó