quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Verdades de outrora...mentiras de agora...


A idéia de que existe alguma coisa além deste simples mundo, desta vida terrena, é algo que permeia o imaginário humano há muito tempo. Não é com os textos bíblicos que estas ideias surgem. Egípcios, Sumérios, povos africanos e asiáticos tem este mito impregnado em suas crenças há milênios.
Estes “fatos” permaneceram em nosso imaginário até os dias atuais, mas até que de uma forma mais amena do que há alguns séculos atrás. No período dos viajantes, das grandes navegações do século XVI, que afirmavam terem encontrado o paraíso terrestre, ou alguma coisa bizarra parecida com isto, havia mapas relatando lugares recém descobertos, como por exemplo, Cuba ou a Martinica próxima ao paraíso, ao jardim do éden.  A Martinica seria descrita por muitos navegadores, religiosos e homens de grande “confiança”, como uma terra habitada somente por mulheres guerreiras, possivelmente as famosas amazonas. Diziam-se desta ilha que em determinadas épocas do ano lá desembarcavam homens para procriar. Quando nasciam meninos, estes eram enviados para a ilha de onde haviam vindo os homens (Porto Rico) e as meninas permaneciam na Martinica com suas mães guerreiras. Textos descrevendo encontros com estas mulheres guerreiras existiram aos montes, em variados lugares, desde descrições dizendo terem sido “avistadas algumas delas em uma praia, a pouca distância, por sinal, da paragem onde Colombo tentara situar o paraíso terrestre.” Pode-se dizer que “de semelhante espetáculo, porém, onde o real e o imaginário parecem fundir-se, deveria nascer o ambiente mais propício ao mito” (HOLANDA, 1994.p.25).
Uma fonte “confiável” a respeito de tais mulheres foi o padre Cristoval de Acunã que disse: ”El tiempo descubrirá La verdad, y si estas son las amazonas afamadas de los historiadores, tesoros encierra em su comarca para enriquecer a todo El mundo! (op.cit.p, 26). Outro religioso, Frei Gaspar de Orellana relatou o “encontro” que teve com tais mulheres. Dizia o frade que as mesmas eram muito ferozes, e que exerciam muito poder diante dos índios, e que estes não tinham coragem de fugir, pois sabiam que se tentassem fazê-lo, seriam mortos a pauladas. As amazonas guerreiras foram descritas pelo frei como “membrudas, de grande estatura e brancas! Tinham cabeleira muito longa, trançada e revolta no alto da cabeça, andavam nuas, e que cada uma delas valia por dez homens em um combate”.
Sérgio Buarque de Holanda nos relata em seu livro “Visão do Paraíso” que estes relatos e estas crenças eram muito difundidas entre vários povos. Religiosos munidos do conhecimento escolástico e filosófico como os já citados, ajudaram a difundir tais “verdades”.  “Santo Isidoro, “acreditava piamente na existência de seres estranhos e chegou a dividi-los em quatro ramos distintos; os portentos, os ostentos, os monstros e os prodígios,” e afirmou:” foram feitos pela vontade divina e a natureza de toda coisa criada é a vontade de todo criador”. (op.cit, p17, 1994).
Esses seres estranhos a que se referia o religioso santificado, se tratavam de mulheres que concebem aos cinco anos para morrerem aos oito, homens sem cabeça e com os olhos e a boca no peito, hermafroditas com um peito feminino e o outro masculino, outros homens com cabeça de cão, com rabos com mais de um palmo de comprimento. Seres humanos que se alimentavam apenas do perfume de flores, ciclopes ( apenas um olho no meio da testa), outros com os pés apontados para trás e com oito dedos (lembra-nos o Curupira?) ou outros com uma só perna (seria o saci?) (op.cit, p18).
Há ainda relatos de homens que nascem velhos e vão se tornando jovens, e da famosa fonte da juventude. Outros relatos que descrevem como “chegar” a locais sagrados como a ilha dos santos. “Na história, por exemplo, das peregrinações de São Brandão, originárias das antigas lendas Celtas, a ilha dos santos, meta dos navegadores irlandeses, só é atingida após dilatada viagem sobre um mar infestado de dragões e gigantes”( isto não se parece a Ilíada de Homero?) ”(op.cit, p.20).
Os relatos a respeito da fonte da juventude são diversos. Na América recém descoberta, tal fonte “ficava” situada no atual estado da Flórida no EUA. Pedro Mártir de Anghiera descreveu a fonte, seus benefícios e entregou este relato ao Papa leão X como um documento portando relatos de experiências verídicas. A crença na existência destas águas milagrosas fez com que muitos aventureiros, nobres e religiosos se embrenhassem no novo mundo em busca de seus efeitos.
Os que se aventuraram nas terras do novo mundo tinham além dos interesses materiais de se conseguir aqui prestígio e riqueza, que para a maioria seria impossível de se conseguir na Europa, traziam em seu imaginário uma série de crenças, de mitologias, que iam muito além das crenças judaico-cristãs. Estes outros mitos ajudaram a moldar e a recriar muitas outras lendas que até hoje sobrevivem. Como já visto, é possível encontrar similaridades entre estas crenças mais antigas e algumas outras lendas que permeiam culturas mais antigas na Europa, e em nossa própria cultura, principalmente nas indígenas.
Podemos nos perguntar sobre quais destas lendas ainda permanecem? Onde é possível encontrar continuidades com estas crenças absurdas? Por que será que tantas pessoas acreditavam em coisas tão inverossímeis aos nossos olhos contemporâneos? Não serão nossas crenças atuais algum dia motivo de textos como esse que escrevo? Até quando durarão nossas verdades?
Todas estas perguntas permeiam minha cabeça. Sabemos de fato que todas estas coisas não se passavam de puro excesso de imaginação, ou quem sabe uma forma de ganhar prestígio como grande aventureiro. Um estudo mais aprofundado nos responderá isso. Por enquanto acho que vale a indagação a respeito de como podemos ser iludidos com falsas verdades, e como estas podem perdurar em nosso imaginário. Cabe a nós nos perguntarmos a respeito de nossas verdades, se são consistentes ou apenas verídicas como nosso papai Noel de nossos primeiros passos nesta vida terrena.
                                                                                           Alex Grijó

quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

Por que gostamos de ser enganados?


Está chegando o dia 25 de dezembro e com ele praticamente a obrigação de consumir desesperadamente, somos bombardeados o tempo todo pela mídia nos incentivando ao consumo desenfreado, uma coisa quase que desumana e irracional. Em nome do papai natal, pois este é o nome do bom velhinho em português, aliás, nome bem sugestivo ligando ele as comemorações natalinas e nos fazendo sentir através de suas musiquinhas a vontade de dar presentes e mesmo sabendo que tudo não passa de pura ilusão, puro marketing para fazermos gastar nosso suado dinheiro. Mesmo assim nos sentimos atraídos por essa data e acabamos fazendo o que a maioria faz, ou seja, somos manipulados pelo espírito natalino e quando caímos na real já nos endividamos em boa parte do próximo ano. Aliás o papai Noel que conhecemos hoje não tem nada do original. No inicio desta tradição quem distribuía os presentes era uma pessoa real sem carruagem fantasiosa e nem renas voadoras. Seu nome era Nicolas ou São Nicolas depois de transformado em santo pela igreja católica.
Nicolas vivia em um lugar chamado myra, hoje Turquia, por volta de 300 dC. A data do natal não tem nada haver com Nicolas, esta tem relação com festividades pagãs em celebração ao retorno da chegada da luz solar por dias mais longos e o fim do inverno. Na verdade eram varias comemorações sem data fixa celebradas em dias diversos em varias partes do mundo. Essa estória de natal, Jesus nascer neste dia, começa  no século 4 DC com o então papa Julius I, que muda para sempre a história do natal escolhendo o dia 25 de dezembro como data fixa para celebração das festividades. A idéia era substituir os rituais pagãos por uma festa cristã, com isso a adoração a Mitra (um outro deus pagão) que tem uma trajetória bem parecida com a de Jesus Cristo, ou melhor, cristo que tem a trajetória parecida com a dele, já que a história de Mitra é bem mais antiga, será esquecida. Com o passar dos anos o mitraismo seria deixado de lado e todos passariam a ser cristãos. É com o imperador Constantino a partir de 312 dc que o cristianismo passará a ser a religião oficial do império romano. A partir daí, várias práticas pagãs serão mescladas ao culto cristão, como por exemplo, a cerimônia em devoção a deusa Isis, que será praticada da mesma forma, só que agora em devoção a Maria.
Mitra que seria uma divindade nascida muito antes do Cristo e que terá a data de 25 de dezembro como dia de seu nascimento, também teria nascido de uma virgem e ressuscitado ao terceiro dia.
Será no ano de 350 d.C. que o natal passará a ser comemorado em 25 de dezembro pelos cristãos. Inicialmente esta data também era utilizada para adorar a Saturno, o deus da agricultura. Será a partir de um decreto do Papa Júlio I em 350, que a veneração a Saturno ou a mitra, dará lugar ao nascimento do menino Jesus.
O papa Júlio por sua conta própria nada mais fez do que inventar uma data para o nascimento de Jesus, escolhendo uma data muito significativa para muitas pessoas, que já tinham o costume de praticar rituais religiosos nesta data. Com certeza ao passar de algumas gerações, estes outros deuses que cederam lugar para o deus cristão como deus oficial de Roma, iriam ser esquecidos. Era como se Júlio tivesse pensado: ”preciso apenas trocar o nome do deus, manter as tradições intocadas e o tempo e as pregações constantes farão o resto.”
A partir daí foram inventadas inúmeras tradições cristãs, e os burgueses do século XIX e sua desenfreada busca pelo lucro souberam aperfeiçoar, fazendo com que você acredite que realmente precisa gastar todo seu décimo terceiro em presentes, que nesta noite nasceu o menino Jesus (que ninguém sabe se de fato nasceu, e que também não nasceu há dois mil e dez anos atrás) e que Jesus é de fato o senhor e salvador e Midas do comércio de fim de ano. E viva o natal, o papai Noel, a mula sem cabeça, o curupira, o saci pererê e tudo aquilo que você acredita que existe, mesmo sabendo que não existe.


                                                                     Lairte Almeida / Alex Grijó

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Obcecados pelo melhor.

Estamos obcecados com "o melhor".
Não sei quando foi que começou essa mania, mas
hoje só queremos saber do "melhor".


Tem que ser o melhor computador, o melhor carro,
o melhor emprego, a melhor dieta, a melhor
operadora de celular, o melhor tênis, o melhor vinho.


Bom não basta. 


O ideal é ter o top de linha, aquele que deixa os
outros pra trás e que nos distingue, nos faz sentir importantes,
porque, afinal, estamos com "o melhor".

Isso até que outro "melhor" apareça -
e é uma questão de dias ou de horas até isso acontecer. 


Novas marcas surgem a todo instante.
Novas possibilidades também. E o que era melhor,
de repente, nos parece superado, modesto, aquém
do que podemos ter.

O que acontece, quando só queremos o melhor,
é que passamos a viver inquietos, numa espécie
de insatisfação permanente, num eterno desassossego.

Não desfrutamos do que temos ou conquistamos,
porque estamos de olho no que falta conquistar ou ter. 


Cada comercial na TV nos convence de que merecemos
ter mais do que temos.
Cada artigo que lemos nos faz imaginar que os
outros (ah, os outros...) estão vivendo melhor,
comprando melhor, amando melhor, ganhando
melhores salários.

Aí a gente não relaxa, porque tem que correr atrás,
de preferência com o melhor tênis.

Não que a gente deva se acomodar ou se contentar sempre com menos.
Mas o menos, às vezes, é mais do que suficiente.

Se não dirijo a 140, preciso
realmente de um carro com tanta potência?

Se gosto do que faço no meu trabalho, tenho que
subir na empresa e assumir o cargo de chefia que
vai me matar de estresse porque é o melhor cargo
da empresa?

E aquela TV de não sei quantas
polegadas que acabou com o espaço do meu quarto?

O restaurante onde sinto saudades da comida de
casa e vou porque tem o "melhor chef"?

Aquele xampu que usei durante anos tem que ser aposentado
porque agora existe um melhor e dez vezes mais caro?

O cabeleireiro do meu bairro tem
mesmo que ser trocado pelo "melhor cabeleireiro"?


Tenho pensado no quanto essa busca
permanente do melhor tem nos deixado
ansiosos e nos impedido de desfrutar o
"bom" que já temos


A casa que é pequena, mas nos acolhe.

O emprego que não paga tão bem, mas nos enche de alegria.

A TV que está velha, mas nunca deu defeito.

O homem que tem defeitos (como nós), mas nos
faz mais felizes do que os homens "perfeitos".

As férias que não vão ser na Europa, porque o dinheiro não deu,
mas vai me dar a chance de estar perto de quem amo... 


O rosto que já não é jovem, mas carrega as marcas
das histórias que me constituem.


O corpo que já não é mais jovem, mas está vivo e
sente prazer.


Será que a gente precisa mesmo de mais do que isso? 


Ou será que isso já é o melhor e na
busca do "melhor" a gente nem percebeu?
 


                                                                                                             Leila Ferreira