sexta-feira, 28 de outubro de 2011

 Kadafi, Getúlio Vargas e a Mídia...
Confesso que fiquei triste ao ver Muamar Kadafi sendo tratado como algo que ainda não sei classificar. As imagens de sua captura, de sua morte em meio a um monte de mercenários ditos”rebeldes” me deixaram perplexo. Vi ali, aquilo que estudo nos livros de História antiga: a era da barbárie. Fiquei triste por se tratar de um ser humano. Um ser humano acusado de ser um ditador, um assassino sanguinário que forçou seu povo a um regime de opressão por mais de 40 anos. Sim, isso é o que dizem nossos telejornais que só transmitem informações antes filtradas pelo crivo norte americano. Quem conhece um pouco de História, sabe que a mentira no meio jornalístico para criar determinadas justificativas para certos atos, são algo comum. Já dizia o “profeta Raul Seixas: “não preciso ler jornais, mentir sozinho eu sou capaz”.
Os índices sociais da Líbia são elevados, maiores até que os de nosso país e de muitos outros aliados americanos. O relatório de desenvolvimento humano/PNUD do ano de 2002 nos informa que a Líbia do cruel ditador Kadafi se encontra na posição de número 58 entre 169 países, enquanto que o Brasil está na posição de número 72. Atrás da Líbia se encontram países como Bulgária, Arábia Saudita, Turquia, China, Macedônia, Romênia, Venezuela e Ucrânia. Neste indicador a Líbia se encontra a apenas três posições do índice de desenvolvimento elevado, onde se encontram países como França, Alemanha, Inglaterra e Estados Unidos. O Brasil está a mais de vinte posições do nível Líbio. As últimas 24 posições deste índice de desenvolvimento são ocupadas por países africanos, que em muitos casos possuem petróleo, diamantes, terras agricultáveis e apoio americano e foram ex colônias dos europeus até a segunda guerra mundial e que após a “independência” herdaram dos ex colonizadores apenas miséria e subdesenvolvimento. No relatório do ano de 2010 pouca coisa mudou. No caso de nosso país ele piorou em uma posição. É agora o número 73 entre os 169 países relacionados pela ONU. Já o país de Muamar Kadafi melhorou cinco posições e está na de número 53 agora! Estes dados são da ONU, que é gerida e controlada pelos  norte americanos e outros que acusam Kadafi de ser um cruel ditador. Mas como é que pode estes índices tão bons e ainda por cima estarem melhorando? E no caso dos países em situação pior? E no nosso caso que estamos piorando? Lula foi pior que Kadafi então?

O país de Kadafi era o melhor entre os mais de cinqüenta países da África. O mais próspero. Agora com o país destruído, França, Itália, Estados Unidos e Inglaterra começaram a fatiar a reconstrução do país. Provavelmente irão colocar no poder algum lacaio, como no caso do Afeganistão, que depois da derrubada do Talibã, assumiu o governo do país um ex diretor das empresas norte americanas Bush. E dizem que foi através da tal democracia...
O conselho que assume o poder agora na Líbia, se não tiver algum diretor das multinacionais Bush, já é certo que terá ex-aliados de Kadafi. Vários dos organizadores do governo “revolucionário” são ex-ministros do ex-ditador assassinado, e todos partidários dos americanos.  As tensões e a guerra civil está apenas começando. Teremos mortes aos milhares a partir da morte de Kadafi. Se o povo era contra ou a favor de Kadafi, saberemos a partir dos novos acontecimentos.
Começa agora entre outras discussões a que diz respeito ao regime de governo a ser implantado na Líbia. O regime já escolhido é a democracia, que se trata de um corpo estranho para o mundo árabe, e que nós ocidentais insistimos em acreditar que o que é bom para nós tem de ser bom para os outros. Não é assim que deveria funcionar. O regime democrático, onde implantado proporciona “liberdade”, qualidade de vida, progresso, diminui a impunidade e a corrupção; cria instituições políticas sérias e comprometidas com o “desenvolvimento para todos”. É o regime que possibilita o fim da miséria, o acesso aos bens de consumo, a transparência dos gastos públicos e a certeza de que nosso dinheiro será de fato investido na educação, nas estradas e na saúde. É isso mesmo? É isso o que a democracia promove de fato? Será que Kadafi produzia índices piores que os nossos? Posso lhes garantir que não. Não mesmo. Em um país governado por um ditador os índices de qualidade de vida são melhores que os nossos e próximo dos países altamente desenvolvidos; os índices de corrupção são inferiores aos nossos; as estradas e a educação assim como a saúde da população também eram melhor que a nossa. Eram.
Muitas vezes me perguntam como é que podem ser mentirosas as notícias veiculadas por telejornais de nosso país. Como poderiam mentir assim tão descaradamente? Primeiramente há que se diferenciar mentira de omissão. Este é o grande crime das agencias de notícias. A seleção, a escolha a respeito do que deve e que não deve ser veiculado. Os interesses de muitos poderosos que estão veiculados a determinados acontecimentos. Veja-se o caso de jornalecos locais que só publicam aquilo que a prefeitura, ou o prefeito e sua corja querem que seja publicado. As manifestações em busca da abertura política no início dos anos oitenta no Rio de Janeiro, que as redes de TV insistiam em não mostrar são outro exemplo. O debate as vésperas da eleição de 1989 em que a edição e manipulação deste mesmo debate em favor de Fernando Collor de Melo fez com que a eleição tivesse uma virada tremenda, acabando por prejudicar o outro candidato, Luis Inácio Lula da Silva. Foram mostradas apenas as imagens favoráveis a Collor de Melo e depois se apresentou um índice em que Collor disparava nas intenções de voto. Mais um exemplo. Estes fatos são muito recentes, mas devido à corrida cotidiana e aos nossos outros interesses não nos ligamos nestas “bobagens”. Temos coisas mais importantes como à escolha das cidades sede da copa ou os preparativos para o carnaval que está por vir.
Mas um caso que desmascara a postura do jornalismo brasileiro diante dos fatos fora o ocorrido nos idos dos anos 1950 e principalmente no ano de 1954 que acabaram levando ao suicídio o presidente Getúlio Dornelles Vargas. Os jornais noticiavam que o presidente estava envolto em um “mar de lama” e que a corrupção assolava todo o seu governo. Os jornais de Assis Chateaubriand, Carlos Lacerda e Roberto Marinho despejavam notícias em que o governo Vargas se via envolvido em irregularidades. Os motivos para os sucessivos ataques são hoje mais do que conhecidos.
Getúlio Vargas em seu segundo governo enfrentou vários problemas devidos aos interesses internacionais em explorar nossas riquezas. Seu governo se via em uma situação complicada, visto que pretendia industrializar o Brasil tornando-o mais moderno e independente, ao mesmo tempo necessitava de capital estrangeiro para financiar esta empreitada. Havia por parte de seu governo a intenção de deixar o país auto-suficiente nas áreas de exploração de petróleo e energia elétrica. Só que isto ia de encontro aos interesses de muitos investidores internacionais. Veja-se o caso da empresa canadense Light que detinha aproximadamente 70% da produção e distribuição de energia elétrica no país. Vargas queria esta produção em nome do governo, pretendia criar a Eletrobrás. Havia um plano de industrialização no país. Uma busca de deixar o Brasil menos dependente das importações e das empresas multinacionais aqui instaladas. A tão aplaudida implementação das indústrias de base no governo Juscelino Kubistchek se iniciam e são combatidas ao máximo no governo Vargas. Entre outras coisas, a busca de acordos para criação de uma indústria de veículos foi intensa no referido período. Enquanto Mercedes e Volkswagen se interessavam no projeto, a GM e a Ford -que dominavam nosso mercado- se recusaram a colaborar com a implantação de uma indústria de veículos no país. Vargas começava a contrariar poderosos interesses. Na área de siderurgia após os incentivos do governo Vargas o país passara de uma produção de 572 mil toneladas de laminados em 1950 para 1 milhão em 1956. A produção de aço dobrou entre 1955 e 1960. Vargas pretendia diminuir as importações em 50% nos próximos 10 anos. Muitas foram às empresas da área química que se instalaram no país a partir de Vargas. A produção de cimento duplicou entre os anos de 1950 e 1954 levando o país a completa substituição das importações por volta de 1957. O país crescia como nunca. Só que estas notícias não chegavam até o povo. Não apareciam nos jornais de Roberto Marinho e Chateaubriand. Estas medidas contrariavam principalmente os interesses norte americanos.       
A tentativa de tornar o país auto-suficiente em relação ao petróleo e criar a Petrobrás foi motivo para que declarasse uma guerra contra o governo Vargas. Congressistas e a grande mídia eram totalmente contrários a criação da Petrobrás e o fim da dependência brasileira de empresas estrangeiras. A FIRJ que representava os industriais do Rio de Janeiro estava cheia de gerentes estrangeiros que tinham logicamente uma postura anti Vargas.
Todo esse esforço para alavancar a industrialização do país em áreas vitais provocou revoltas ferozes do capital internacional. Isso levou os descontentes com seu governo a criar meios de desarticulá-lo. E os meios de comunicação foram vitais para a difamação de seu nome e seu governo. Os dados referentes ao crescimento econômico não eram divulgados. O aumento no nível de empregos, a diminuição das importações e os incentivos para instalações de empresas no país eram totalmente excluídos dos noticiários. Vargas possuía apenas um jornal do seu lado, o que não era suficiente para enfrentar o poderio do capital financeiro que inundava de dinheiro os grandes jornais do país. Toda a pressão sobre Vargas o leva a cometer suicídio, que serviu de fato para adiar um golpe civil militar, que só viera ocorrer 10 anos depois.
Lembro estes fatos referentes à Era Vargas e seu governo apenas para que façamos uma reflexão a respeito das verdades impostas pela mídia. São “verdades” selecionadas, escolhidas sempre baseadas nos interesses de quem manda e quem paga mais. Nunca se leva ao ar algo imparcial, claro. Ciro Marcondes Filho em “O capital da notícia” nos diz que “um conglomerado jornalístico raramente fala sozinho. Ele é ao mesmo tempo a voz de outros conglomerados econômicos ou grupos políticos que querem dar ás suas opiniões subjetivas e particularistas o foro de objetividade.[1]Complementando a minha fala e a de Marcondes Filho, vejamos o comentário de Marialva Barbosa da UFF que em “Senhores da memória”, uma tese de concurso público nos explica que “a objetividade da notícia é há muito tempo vista como uma falácia, até mesmo para os mais ingênuos dos profissionais. Ao selecionar, ao hierarquizar, ao priorizar a informação-dentro de critérios altamente subjetivos ligados a interesses nem sempre condizentes com o dos leitores; o que o jornalismo está fazendo é uma seletiva reconstrução do presente.[2]
Se Kadafi era um ditador implacável é algo a ser questionado como uma verdade absoluta. Se assim fosse não é possível entender do por que da invasão da OTAN apenas neste momento. É muito curioso ver Muamar Kadafi ao lado de Bush, Obama, Clinton ou Tony Blair sorrindo e se confraternizando. Todos estes líderes e seus respectivos países mantiveram estreitas ligações com a Líbia nas últimas décadas. Infelizmente assim como fizeram com Sadam e Bin Laden não poderemos ver Kadafi dar algumas declarações depois de preso. Infelizmente nenhum dele pode falar. Se defender. Acho que teriam muitos segredos do submundo dos governos de Londres e Washington a nos revelar. Mas, estes possíveis segredos sujos foram para o além, e no momento, só poderão ser compartilhados, talvez, com Alá...
                    ALEX SANDRO GRIJÓ RIBEIRO



[1] MARCONDES FILHO, Ciro. O Capital da notícia. São Paulo, Ática, 1989, p.11 in: ASSIS, Charleston José. Classes populares, cultura política e revolta no Rio de Janeiro. Niterói, Nitpress, 2007, p.17.
[2] BARBOSA, Marialva. Senhores da memória. Tese de concurso público para professor titular no setor de jornalismo. Departamento de comunicação social. UFF, 1993, p.11.in: ASSIS, p.17.

Nenhum comentário:

Postar um comentário